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Quatro vencedores dos prémios Gazeta 2015 traçam as coordenadas para se desenvolver jornalismo de qualidade, apesar de todas as dificuldades que a profissão enfrenta.
O jornalismo ocidental vive uma longa crise, marcada pelo fecho de jornais, despedimentos e cortes nas despesas. A dificuldade em encontrar um modelo de negócio sustentável, que garanta o futuro da profissão, levanta questões sobre as cedências dos jornalistas a interesses, especialmente empresariais. Publicar primeiro, confirmar depois, optar pelo sensacionalismo, esquecer as regras deontológicas… Existem acusações para todos os gostos. Catarina Santos, Sibila Lind, Ricardo Rodrigues e Rita Colaço, contemplados em 2015 com os prémios Gazeta, atribuídos anualmente pelo Clube dos Jornalistas, analisam os desafios da profissão, identificando as falhas, mas também as oportunidades da profissão.
Jornalista do Público, Sibila Lind conquistou o prémio Revelação com o trabalho “Anatomia de uma Ópera” que implicou um mês de trabalho. “Tempo e meios” são as condições essenciais que aponta para se fazer jornalismo de qualidade. O tempo, explica, é necessário “para descobrir, acompanhar e aprofundar uma história, para que ela não seja mais uma no meio de tantas”. Já os meios, possibilitam desenvolver e contar cada história da melhor maneira e são importantes quer os humanos, como “jornalistas, Web designers, fotógrafos”, como os técnicos “para não termos limites de criatividade”.
“Independência financeira” é também uma necessidade incontornável, afirma Catarina Santos, jornalista da rádio Renascença, vencedora do prémio Gazeta Multimédia com a reportagem “20 anos são dois dias”. “Sem um modelo de negócio sustentável, não se faz jornalismo”, afirma. “O problema é que o modelo de negócio que funcionou durante muito tempo já não serve”, o que se tem traduzido numa “escassez de jornalismo de investigação” e numa “gravíssima precarização da profissão”. À procura de soluções, “muitos têm apostado na procura do clique a qualquer preço − o que manifestamente não resolve o problema de fundo e até o agrava, por descredibilizar o nosso papel”.
Para Ricardo Rodrigues, só duas condições são importantes para se fazer jornalismo de qualidade: “curiosidade e rigor”, o que implica “um grande trabalho de verificação”. O jornalista do Diário de Notícias conquistou o prémio Imprensa com “Um milagre na Guerra ou as muitas vidas de Isabel Batata Doce” e é perentório: nada mais é “verdadeiramente necessário”, pois tudo “o resto é técnica”.
“Mau jornalismo não é jornalismo”
Distinguida na categoria Rádio com a reportagem “Mar da Palha, Zona C”, Rita Colaço, jornalista da Antena 1, considera bom jornalismo aquele que está “atento ao outro, olhando em todas as direções e para as diferentes camadas de uma vida, vidas ou fenómenos, confrontando-as”. Para Rita Colaço, “o jornalismo deve ser livre, responsável, comprometido com a verdade, ético e sensível”. Logo, só pode ter qualidade. “Mau jornalismo não é jornalismo. É outro ofício qualquer…”. Uma opinião partilhada por Catarina Santos, que sublinha a necessidade absoluta de isenção, rigor e ética desta profissão.
“Bom jornalismo é, na maior parte das vezes, saber olhar − ver aquilo em que ninguém reparou, mesmo quando está e sempre esteve à frente dos nossos olhos”, considera Ricardo Rodrigues. Isto porque, “jornalismo é testemunho do mundo, denúncia das injustiças, controlo dos poderes”. Assim sendo, “sem jornalismo, bem vistas as coisas, não há democracia”, afirma. Através do olhar sobre o mundo que transmite, é responsabilidade do jornalista “dar aos cidadãos ferramentas para que eles possam tomar as suas próprias decisões esclarecidamente”.
Mas, afinal, o jornalismo é hoje uma realidade diferente? As opiniões dividem-se. “Não sei se o jornalismo já não é o que era”, diz Rita Colaço. “O que temos é ‘jornalismo’ que não devia ser o que é: a reboque de agendas, de comunicados de imprensa, de escolhas editoriais mais sexy e lucrativas e menos cumpridoras do dever de informar com seriedade, sensibilidade e responsabilidade”, afirma. Catarina Santos, por seu turno, considera que “são as circunstâncias em que a maioria tem hoje de fazer o seu trabalho” que condicionam o jornalismo.
Uma dessas circunstâncias é a aceleração da informação. “Os jornalistas são chamados a cumprir mais em menos tempo, comprometendo o olhar, a reflexão, a investigação, a recolha e a edição”, explica Rita Colaço. O trabalho do jornalista assemelha-se a “um comboio de alta-velocidade que deixa de parar em muitas estações e apeadeiros”. E ao seguir viagem desenfreadamente, “deixa para trás, porventura, o essencial e deixa passageiros que, não tendo outros recursos ou alternativas, ficam parados no mesmo lugar e afinam o mundo pelos seus próprios mundos”.
Tempos difíceis, mas desafiantes
Apesar de reconhecer que o jornalismo vive “um momento crítico e de muitas mudanças”, Catarina Santos considera que “este é um tempo extraordinário para se ser jornalista”. Isto porque “nunca tivemos tantas ferramentas ao nosso dispor para enriquecer uma história e a forma como a contamos; para trazer os leitores para dentro das notícias, interagindo com elas; para verificar informação e obter novas leituras a partir dos dados”.
Ricardo Rodrigues também considera que “nos últimos anos assistimos a profundas transformações na forma de contamos histórias”, mas sublinha que “jornalismo é jornalismo, seja qual for o formato”, ou seja, “a ossatura é a mesma, o conteúdo é e será sempre o mesmo”. As narrativas relevantes e significativas mantêm-se, assim, indiferentes à evolução dos suportes técnicos.
Ao contrário do jornalista do Diário de Notícias, Sibila Lind prefere destacar as diferenças. O jornalismo, agora, “é feito numa secretária, através de telefonemas, entrevistas à distância. A escrever sobre o que os outros média escrevem. É mais rápido, competitivo, muitas vezes excessivo e tão igual”. Fatores que tornam vital “pensar diferente”. Para a jornalista do Público, “é preciso não só encontrar uma boa história”, como “a melhor forma de a contar”. Essa necessidade ganha asas com o advento do multimédia, com a possibilidade de misturar fotografia com áudio ou vídeo com ilustração e texto. “É um desafio que antes não existia”, constata. Contudo, os valores do jornalismo, sublinha, mantêm-se: “informar mantendo a ética”, mas “agora com alguma criatividade à mistura”.
Na opinião de Catarina Santos, “urgente é que os órgãos de comunicação social se concentrem em olhar para a frente, procurar diversificar fontes de receitas que não comprometam a independência, arriscar outros modelos”. Um caminho que não é fácil, admite. “Mas quanto mais tempo perdermos a lamentar o inevitável, mais tiros nos pés continuaremos a dar”, com custos enormes “para a qualidade da democracia”. E é por isso que não há tempo a perder: mais, ou seja, melhor jornalismo, precisa-se.